terça-feira, 30 de outubro de 2007

Há sempre alguém...


O Sr. A. estava internado no serviço por icterícia obstrutiva por colangiocarcinoma (carcinoma primitivo do fígado que atinge as vias biliares). Tinha vários antecedentes, entre eles Doença de Alzheimer.
Tinha catéter urinário, sonda nasogástrica, oxigenoterapia por máscara, catéter central, nutrição parentérica, e uma série de outras coisas... Mas era um senhor encantador. Um ar muito tranquilo, sujeito várias vezes ao dia a pesquisas de glicemia, administração de insulina e heparina, colheitas de sangue, ... Todo o dia tinha alguém em volta dele a fazer exames, a posicionar, um sem fim de coisas... E nunca se mostrava desagradado, sempre com o seu olhar sereno...
Fiquei com ele uma noite e a tarde seguinte. Até me custava incomodá-lo de tantas vezes que tinha de o fazer... Na noite, teve vários picos febris, com uma sudorese intensa... Notava-se no meio do seu ar tranquilo um pouco de inquietação que não o deixava bem. Respirava com mais dificuldade... Troquei-lhe a bata, passei-lhe umas esponjas frias pelo corpo, troquei-lhe os lençóis, e coloquei-lhe compressas frias na testa. Ao fim de algum tempo, voltei a medir a temperatura. 36,8º C, tinha baixado. Notava-se o seu alívio, respirava melhor e conseguiu dormir grande parte da noite. Soube bem vê-lo assim...
Na tarde seguinte, o mesmo se sucedeu. Foi necessário trocar a sonda nasogástrica, tarefa que me coube. Depois, fiquei um pouco a falar com ele, mas não se percebia quase nada do que dizia. No fim, acabei por lhe ligar a TV e ele lá ficou um pouco entretido. Antes de ir embora, fui lá vê-lo de novo. Estava a saturar bem, a 98%, e com o seu ar sempre tranquilo. A temperatura estava normal, bem como os restantes parâmetros vitais. Tentou dizer-me algo que não consegui perceber. Então, percebendo que eu não o compreendia, esboçou um sorriso, retirou a máscara e atirou-me um beijo... Não sei explicar o que senti... Sei que vim embora a sorrir, sozinha, a pensar com os meus botões...

Ontem cheguei para fazer manhã. Durante a noite, o Sr. A. iniciou um quadro de dificuldade respiratória, e foi transferido para a Unidade de Cuidados Intermédios onde acabou por falecer... Agora penso que talvez ele soubesse o que o esperava... E quis despedir-se de alguém... Por acaso, era eu quem lá estava...


E continuo a pensar no que ele me quereria dizer...



***

1 comentário:

Anónimo disse...

='( só tu Madrinha para poderes contar esta história com a mesma intensidade com k a viveste...

Talvez o Sr. A. te kisess agradecer cada gesto, cada palavra, cada pedacinho k dispensast do teu tempo para com ele;)

Continua a ser essa estrelinha brilhante k és e a proporcionar sorrisos e melhores momentos às pessoas de quem cuidas=)

Jinhuuu gandiii*********

Mt orgulho em ti=)

*GMDT*